O que o retorno do voo supersônico pode significar para as mudanças climáticas
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O que o retorno do voo supersônico pode significar para as mudanças climáticas

Quão rápido é rápido o suficiente, quando o clima está em jogo?

O que você encontrará neste artigo:

Impacto climático do voo supersônico
A promessa dos combustíveis sustentáveis
Vale a pena acelerar?

Como já admiti antes, poucas coisas me encantam tanto quanto embarcar em um avião. Sei que é uma afirmação ousada para um repórter de clima, devido a todas as emissões associadas, mas é a verdade. Por isso, fico tão intrigado quanto qualquer outra pessoa com os esforços para reviver o voo supersônico.

Na semana passada, a Boom Supersonic completou seu primeiro voo de teste supersônico com a aeronave XB-1. Assisti à transmissão ao vivo e a empolgação era contagiante: acompanhei a expectativa dos apresentadores durante a decolagem e a aceleração, e depois a celebração quando ficou claro que a aeronave havia rompido a barreira do som.

Ao mesmo tempo, sabendo o que sei sobre o clima, a promessa de um retorno ao voo supersônico perde um pouco do brilho. Estamos em um momento crítico das mudanças climáticas, em que precisamos cortar drasticamente as emissões, e o voo supersônico provavelmente nos levaria na direção errada. Tudo isso me faz questionar: quão rápido é rápido o suficiente?

A indústria da aviação é responsável por cerca de 4% do aquecimento global até o momento. Atualmente, apenas cerca de 10% da população mundial viaja de avião a cada ano. À medida que a renda aumenta e o voo se torna mais acessível para mais pessoas, podemos esperar um crescimento no tráfego aéreo e, com ele, um aumento nas emissões de gases de efeito estufa.

Se tudo continuar como está, as emissões da aviação podem dobrar até 2050, segundo um relatório de 2019 da Organização da Aviação Civil Internacional.

O voo supersônico pode muito bem contribuir para essa tendência, porque voar mais rápido exige muito mais energia – e, consequentemente, mais combustível. Dependendo da estimativa, em termos per capita, uma aeronave supersônica consumirá entre duas e nove vezes mais combustível do que um avião comercial atual. (O número mais otimista vem da própria Boom, comparando seus aviões com cabines de primeira classe).

Além das emissões de gases de efeito estufa decorrentes do aumento do uso de combustível, outros impactos climáticos potenciais podem surgir de poluentes como óxido de nitrogênio, enxofre e carbono negro, liberados em altitudes mais elevadas, e comuns nos voos supersônicos. Para mais detalhes, confira minha última matéria.

A Boom aponta os combustíveis sustentáveis para aviação (SAFs) como solução para esse problema. Afinal, esses combustíveis alternativos poderiam eliminar todos os gases de efeito estufa associados à queima do querosene de aviação.

O problema é que o mercado de SAFs ainda está engatinhando. Em 2024, essas matrizes representaram menos de 1% do abastecimento global de combustível de aviação e ainda são várias vezes mais caras do que os combustíveis fósseis. Além disso, os SAFs disponíveis hoje tendem a reduzir as emissões entre 50% e 70% – ainda muito longe do nível zero de emissões.

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As coisas (esperançosamente) irão avançar no tempo que a Boom levará para progredir na retomada do voo supersônico — a empresa planeja começar a construir sua aeronave em escala real, a Overture, em algum momento do próximo ano. Mas especialistas estão céticos quanto à disponibilidade e ao custo do SAF (combustível sustentável para aviação), questionando se ele será acessível o suficiente para descarbonizar a aviação como um todo – sem falar em abastecer uma nova categoria de aviões que consomem ainda mais combustível para percorrer a mesma distância.

O jato supersônico Concorde, que operou de 1969 a 2003, conseguia viajar de Nova York a Londres em pouco mais de três horas. Eu adoraria experimentar esse voo — ultrapassar a velocidade do som é uma novidade empolgante, e uma travessia mais rápida pelo Atlântico poderia abrir novas possibilidades de viagem.

Entretanto, um especialista com quem conversei para esta matéria mencionou que, na verdade, está tentando convencer a indústria de que os aviões deveriam voar um pouco mais devagar. Reduzindo a velocidade em apenas 10%, as aeronaves poderiam ter uma diminuição desproporcional nas emissões.

É certo que a tecnologia pode melhorar nossas vidas. Só que, às vezes, há um claro dilema entre como ela pode trazer conforto e conveniência para um pequeno grupo de pessoas e como pode contribuir para uma crise climática de proporções globais.

Não sou um ludita, e certamente viajo de avião mais do que a média das pessoas. Mas sinto que talvez devêssemos encontrar uma maneira de desacelerar — ou, pelo menos, não acelerar em direção aos piores impactos que o aquecimento do planeta pode trazer.

Por Casey é repórter de clima na MIT Technology Review,
especializada em assuntos ligados a energia renovável, transporte e como a tecnologia pode combater as mudanças climáticas.

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