O setor da saúde tem passado por inúmeras mudanças nos últimos anos. Áreas que eram consideradas arcaicas começaram a digitalizar os seus processos e criar estratégias para ganhar mais eficiência operacional. Isso aconteceu principalmente por conta da pandemia de Covid-19, que obrigou as instituições de saúde a adotarem inovações tecnológicas para resolver problemas que vieram à tona durante este período.
Por isso, nos últimos anos, vimos o surgimento de novas startups que atuam nesse segmento, as chamadas healthtechs. De acordo com um levantamento feito pela Liga Ventures, em parceria com a PwC Brasil, o número de healthtechs no país aumentou 16,11% entre 2019 e 2022. As informações fazem parte do estudo “Evolução das startups no setor de saúde”, que analisou a inovação nesse mercado com foco nas soluções de startups entre 2019 e 2022.
O estudo foi feito com 596 startups de 35 categorias, como oncologia, nutrição, planos e financiamento, autismo, bem-estar físico e mental, inteligência de dados, seniortechs, saúde no trabalho, entre outras, por meio do Startup Scanner, e aponta que os segmentos com mais empresas ativas são planos e financiamento (8,31%), seguida por gestão de processos (7,81%) e exames e diagnósticos (6,80%).
Com relação a distribuição das startups ativas por estado entre 2019 e 2021, São Paulo lidera o ranking (50,13%), em segundo lugar Rio Grande do Sul (8,06%) e em terceiro Rio de Janeiro (7,81%). Outro dado interessante desta pesquisa foi com relação ao investimento captado nessa área.
As healthtechs movimentaram R$ 1,79 bilhão, em 36 operações de fusões e aquisições, sendo que oito delas envolveram startups das categorias de capacitação, informação e educação, inteligência de dados, monitoramento home care, gestão de processos, gestão financeira e contábil e armazenamento e análise de imagens.
Já o estudo Inside Healthtech Report aponta este setor de startups como sendo o quarto com maior crescimento em 2021, pois teve um investimento de R$ 530,6 milhões, resultando em um crescimento de 402% em comparação com o ano anterior. Com isso, a tendência é que a concorrência com as empresas tradicionais do setor se torne cada vez mais acirrada, semelhante ao que acontece hoje entre os bancos tradicionais e as fintechs.
Essa expectativa ocorre porque as healthtechs surgem para resolver dores das empresas tradicionais do setor, como softwares de gestão e prontuário, Inteligência Artificial e Big Data. Todas essas soluções visam melhorar a experiência do paciente com as instituições de saúde, agilizando o agendamento de procedimentos em canais online, utilizando chatbots para otimizar o atendimento, consolidando os dados não sensíveis e traduzindo-os em personalização na comunicação, entre várias outras aplicações.
Outra pesquisa feita pela KPMG, apontou que, na opinião de 97% dos entrevistados, a Covid-19 foi responsável por acelerar as mudanças tecnológicas que ocorreram no setor. O levantamento ouviu cerca de 200 CEOs que atuam nas mais diversas instituições da saúde. Visando a demanda do mercado e as vantagens para o segmento, 79% dos participantes acreditam que ainda há muitas modificações a serem realizadas nos próximos três anos, principalmente no âmbito tecnológico.
É fato que durante este período, todas essas transformações têm sido pautadas pela experiência dos pacientes, isso porque cada vez mais eles devem estar no centro de toda inovação, já que eles são os principais beneficiários de tudo o que está acontecendo. Toda situação vivida pelo país obrigou os profissionais da área a agirem de forma diferente e desenvolverem soluções que resolvessem os gargalos daquele momento, tornando processos mais ágeis e atendendo grande parte da população que estava vivendo momentos de aflição e angústia.
Dentre as principais mudanças que pudemos observar neste período foi a implementação da telemedicina que foi muito útil não só para diminuir a chance de contágio para profissionais e pacientes como também para aumentar o volume de consultas e atendimento, pois à distância os médicos que trabalham no consultório tiveram a chance de atender os casos de Covid-19, dando a eles às devidas orientações.
Já o setor farmacêutico também passou por grandes transformações neste período. Por conta disso, eles tiveram que buscar alternativas para manter o contato com os laboratórios mesmo que à distância, principalmente porque as atividades e a entrega deveriam continuar, visto que a demanda por equipamentos e medicamentos aumentou significativamente durante a pandemia. Por isso que o uso de plataformas se fez necessário neste período.
Já na outra ponta, outros problemas que ficaram ainda mais evidentes nos últimos anos foram aquelas relacionadas a saúde mental das pessoas. É o que mostra um estudo divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em que os casos globais de ansiedade e depressão aumentaram em 25% no primeiro ano de Covid-19. Outro dado importante aponta que entre janeiro de 2020 a dezembro de 2021, 14,9 milhões de pessoas morreram de doenças associadas direta ou indiretamente a pandemia.
Dentre os fatores que influenciaram para que tivesse esse aumentou, destaca-se solidão, medo da doença, morte e questões financeiras. Por isso que a procura por profissionais especializados nesse tipo de problema teve um avanço considerável.
De acordo com o levantamento feito pela Associação Brasileira de Psicologia da Saúde (ABPSA), 80% dos psicólogos perceberam uma procura muito maior por atendimento neste período. Mas isso só foi possível graças a tecnologia que permitiu com que eles fizessem atendimento online por meio de ferramentas digitais e terapia online.
Além disso, pudemos ver também a criação de procedimentos à distância, a ampliação do monitoramento online do paciente, adoção de protocolos rígidos de segurança e aumento do uso de plataformas para o agendamento de consultas.
Mas o que nós podemos esperar para o futuro frente a todas essas inovações, visto que tudo isso é só uma pequena parcela do que a tecnologia é capaz? Com a IA, é possível coletar dados dos pacientes para terem um diagnóstico mais preciso e assertivo. Além disso, ela consegue projetar hospitais físicos para o computador para que os gestores consigam separar os diferentes departamentos, como pronto-atendimento, unidade de internação e UTI e assim analisar fluxo de atendimento para garantir a quantidade de quartos necessários para atender a demanda, levando em consideração os casos e a sazonalidade.
Outra solução que será muito utilizada pelas instituições de saúde e também por outras áreas da economia é o metaverso. Muitas pessoas acreditam que ela só será aplicada no segmento de varejo, mas os médicos também serão beneficiados. Muito se engana quem acha que essa é uma realidade distante, isso porque ela já vem ganhando força nos dias de hoje.
Por meio dela, os médicos podem ver o seu paciente em duas dimensões, tendo a possibilidade de analisá-lo a partir das informações compartilhadas pelo paciente e trazer diagnósticos mais precisos. Assim, o metaverso vai ajudar muito no tratamento de saúde de baixa e alta complexidade. Isso mudará diversos paradigmas do setor, pois os dados e os algoritmos nesse caso serão os grandes protagonistas e evitarão que os médicos façam perguntas triviais.
E isso tem sido cada vez mais aceito pelos profissionais. De acordo com o levantamento “Accenture Digital Health Technology Vision 2022“, o “metaverse continuum” irá transformar todos os aspectos da vida e dos negócios na próxima década, incluindo o setor de saúde. O estudo mostra que 80% dos executivos do setor entrevistados disseram que o uso de dispositivos de Internet das Coisas (IoT) aumentou exponencial nos últimos três anos.
Outra tendência é a cirurgia robótica que utiliza robôs para realizar operações menos invasivas e mais precisas. Ela é indicada para as doenças que precisam de tratamento cirúrgico, como câncer de ovário, de endométrio ou colo do útero, patologias da tireoide e de laringe, câncer de pulmão, tratamento de hérnias da parede abdominal, doença do refluxo gastroesofágico etc. Dentre as vantagens destaca-se a redução de complicações, dores e sangramentos, diminuição do tempo de internação e recuperação, melhores resultados estéticos, maior segurança e aumento da precisão.
Diante de tantos benefícios, a tecnologia se faz cada vez mais presente e necessária no dia a dia da equipe médica. Mesmo com todas as complexidades que possui muitas vezes, os profissionais do setor já vêm usando algumas dessas inovações. Um estudo feito pela Associação Paulista de Medicina (APM), em abril, mostra que 65,15% deles utilizam alguma ferramenta digital no seu trabalho. Já o prontuário digital é adotado por 48,10% das instituições médicas e programas de gerenciamento de clínicas.
Por fim, a partir de tantas transformações é preciso se atentar a experiência de cada paciente, pois ela será determinante para o sucesso das soluções que serão adotadas em cada procedimento. Além disso, precisamos reforçar que essas tecnologias têm beneficiado a forma como as pessoas vem cuidando da sua própria saúde. A partir das vantagens que elas proporcionam no dia a dia, é possível ficar cada vez mais de olho na prevenção de doenças, acarretando assim na qualidade de vida delas.
*Gustavo Caetano é CEO da Sambatech e Samba Digital