Já vimos nesta coluna como a evolução dos contratos inteligentes em blockchain tornou possível o surgimento das Finanças Descentralizadas (DeFi), o setor de crescimento mais rápido dentro do ecossistema blockchain global.
Também exploramos como NFTs e Blockchain, sua tecnologia subjacente, chamaram a atenção das pessoas, e foram decisivos para sua popularidade e para a transformação do modo como consumimos games, música, arte e cultura.
Hoje vamos explorar os DAOS, organizações autônomas descentralizadas regidas por contratos inteligentes, acordos auto executáveis que vivem na blockchain, e têm despertado interesse de investidores tradicionais que procuram alocar capital em novos setores.
O que é uma DAO, afinal?
Imagine uma organização ou um grupo de indivíduos agindo em conjunto, sem uma autoridade central. Ao contrário de uma organização tradicional, uma “Decentralized Autonomus Organization” (DAO) é de “uma organização autogovernada única e exclusivamente por contratos inteligentes em blockchain, com estatutos e regras de procedimento, que substituem o gerenciamento operacional cotidiano por um código que se autoexecuta”.
Organizações autônomas descentralizadas (DAOs) são o exemplo que mais representa os contratos inteligentes complexos.
A natureza descentralizada da blockchain e os atributos resultantes do código de contrato inteligente, que podem ser usados para criar DAOs autossuficientes e potencialmente infinitos, levantam novas questões importantes em termos de responsabilidade legal e o destino dos fundos, como veremos a seguir.
Do que uma DAO é capaz?
Depois que o PleasrDAO, uma organização autônoma descentralizada, adquiriu um álbum raro do Wu Tang Clan por US$ 4 milhões é dólares, muitos se questionaram o que viria a seguir.
E graças a um leilão na Sotheby’s, descobrimos rapidamente. Um DAO, formado em apenas uma semana, levantou o equivalente a US$ 47 milhões em ETH, na tentativa de adquirir uma cópia rara da Constituição dos Estados Unidos.
Mas são infinitas as possibilidades de caso de uso para DAOs, podendo abranger protocolos de governança como aplicações de finanças descentralizadas (DeFi), clubes sociais onde indivíduos com objetivos semelhantes têm acesso exclusivo para falar sobre seus interesses em comum, novos meios de investimento onde membros reúnem capital para investir em oportunidades emergentes na indústria cripto/blockchain, e outras organizações que atuam como caça talentos e alocam recursos e serviços com um propósito econômico.
Como DAOs são capazes de proporcionar uma nova camada social de coordenação na Internet sem a necessidade de uma liderança centralizada, possivelmente se tornarão amplamente adotados num futuro próximo.
Em uma organização autônoma descentralizadas, a tecnologia Blockchain e contratos inteligentes reduzem os custos de transação e de administração com níveis mais altos de transparência (do que em uma empresa tradicional), alinhando os interesses de todas as partes pelas regras de consenso vinculadas ao token nativo.
Mas nada melhor do que um comparativo para compreendermos melhor o alcance dos DAOs.
No que DAOs se diferenciam das organizações tradicionais?
O interesse dos investidores em torno das DAOs
O interesse em torno das organizações autônomas descentralizadas (DAOs) tem despertado interesse, não só dos membros da comunidade cripto, mas também de investidores que procuram direcionar recursos para novos setores.
Nos últimos dois meses, fundos e Venture Capital têm alocado capital para projetos que fornecem infra-estrutura e ferramentas para DAOs para facilitar as decisões de governança e gestão de tesouraria.
Fundos de risco como Andreessen Horowitz, Union Square Ventures, Variant Fund, e outros também têm explorado formas de se tornar participantes ativos e membros da comunidade de DAOs. Recentemente, DAOs como Bright Moments, Fingerprints e Friends with Benefits aceitaram capital de risco em troca de suas fichas de governança.
No total, podemos identificar mais de 150 projetos de DAOs em expansão, abrangendo 8 verticais diferentes. Vejamos alguns casos de uso.
10 exemplos de DAOs
O famoso MakerDAO é uma plataforma de crédito descentralizada que emite CDPs (posições de dívida colateral), que ajudam a estabilizar o valor de stablecoin associada (Dai).
O DeGate, por sua vez, é um protocolo comercial Ethereum Layer 2 que pretende ser formado, governado e de propriedade da comunidade como um DAO.
PieDAO é uma organização descentralizada para a gestão de ativos, utilizando uma carteira ponderada pelo mercado.
Já o BadgerDAO é um projeto cross-chain, isto é, projeto de cadeia cruzada que visa construir uma ponte para trazer o ativo Bitcoin para a rede do Blockchain Ethereum. O projeto foi criado como um DAO e focado inteiramente na construção de serviços DeFi habilitados para Bitcoin.
DAOVENTURES é um gestor de dinheiro que utiliza contratos inteligentes que permitem e administram os fundos de investimento DeFi através de redes de cadeias de bloqueio como Ethereum e Binance Smart Chain.
O Tally é um projeto focado na governança on-chain que fornecerá um painel de controle da governança para ajudar na tomada de decisões em escala em protocolos e organizações descentralizadas.
MUSE0 está construindo um moderno museu nativo da Internet para preservar e arquivar as fichas não fungíveis (NFTs). O DAO irá coletar e curar uma coleção permanente de NFTs representando artistas e idéias de todo o mundo.
Há também o PartyDAO uma comunidade que criou o PartyBid, que permite que grupos de pessoas combinem seu capital e lances nos leilões de NFT, o que então fraciona o NFT em frações de propriedade.
PleasrDAO , de outro lado, é um investimento coletivo que compra e comissiona obras de arte da NFT, investe em DeFi e administra uma incubadora para fazer avançar o setor de ativos digitais.
Por fim, o RaribleDAO é o DAO que governa o Rarible Protocol, um mercado NFT que permite a qualquer pessoa criar, acessar e monetizar itens digitais.
Bitcoin: a primeira organização verdadeira descentralizada e autônoma
A Rede Bitcoin pode ser considerada como a primeira organização verdadeiramente descentralizada e autônoma, coordenada por um protocolo de consenso que qualquer pessoa é livre para adotar.
Ela fornece um sistema operacional de valor sem instituições ou gerentes, e tem permanecido resistente a ataques e tolerante a falhas desde que o primeiro bloco foi criado em 2009.
Nenhuma entidade central controla a Bitcoin, o que significa que enquanto as pessoas continuarem participando da rede, apenas uma interrupção de energia mundial poderia fechar a Bitcoin.
O protocolo blockchain subjacente permite uma rede de incentivo, alimentada pelas regras de governança vinculadas a seu token criptográfico. Estes conjuntos de regras de governança de tokens da camada de consenso permitem a coordenação automática e transparente de um grupo díspar de pessoas que não conhecem ou não confiam umas nas outras.
O pulo do gato da rede Bitcoin foi mostrar que os tokens podem ser usados como um meio de programação do comportamento, ou seja, de orientação do comportamento econômico dos nós da rede. Este mecanismo de incentivo provou ser um motivador eficaz na execução de serviços para uma rede.
Takeaways
Com o surgimento da Rede Ethereum, o conceito de DAOs passou da pilha de tecnologia do protocolo de cadeia de bloqueio para o contrato inteligente. Enquanto antes se precisava de uma rede de blockchain com um protocolo de consenso resistente a ataques para criar um DAO, os contratos inteligentes tornaram a criação de DAOs facilmente programável, muitas vezes com apenas algumas linhas de código, e sem a necessidade de criar sua própria infra-estrutura de blockchain.
A natureza descentralizada da blockchain e os atributos resultantes do código de contrato inteligente já podem ser usados para criar DAOs autossuficientes e potencialmente infinitos.
DAOs são autônomos, pois não precisam (nem prestam atenção) ao seu criador original e são autossuficientes, na medida em que podem cobrar dos usuários seus próprios serviços (ou ativos) para pagar pelos serviços que prestam.
E mais, um DAO pode contratar pessoas ou contratos inteligentes para realizar tarefas específicas, e pode potencialmente vender seus próprios serviços para terceiros.
E você aceitaria ser transacionar com um DAO para, por exemplo, ser contratado para, por exemplo, receber o pagamento em troca de um serviço?
Este artigo foi produzido por Tatiana Revoredo, membro fundadora da Oxford Blockchain Foundation, representante no European Law Observatory on New Technologies e colunista da MIT Technology Review Brasil.