Sonho de infância sustentável
Meu sonho de infância era ter minha própria marca de moda. Essa foi uma paixão que nutri ao longo dos anos e o meu interesse pela moda foi crescendo de forma exponencial ao longo do tempo. A minha carreira de atriz me proporcionou a grande oportunidade de envolvimento com o setor de maneira expressiva. Participei de grandes campanhas, fui convidada para grandes eventos dentro e fora do Brasil, estive na primeira fila das maiores semanas de moda do mundo. Mas eu sentia que estava vivendo a moda do lado do espectador, do consumidor, do admirador, e eu queria mais. Essas oportunidades e o contato direto com as grandes marcas apuraram o meu olhar e expandiram o meu repertório, o que fez com que eu me sentisse mais preparada para encarar o desafio de empreender dentro do setor. Neste ponto, pesou a questão do tempo. Devido aos meus diversos compromissos de trabalho, eu estava sempre planejando e sonhando com esse novo passo, mas não era possível colocar as ideias em prática. Com a pandemia e a pausa imposta a todos nós, finalmente consegui tempo para tirar as ideias do papel.
Assim, eu e minha equipe lançamos a Ginger em julho de 2020, em meio à pandemia, com o país e o mercado da moda em uma situação muito frágil. O desafio foi muito grande, pois era uma situação inédita e não havia um road map a ser seguido. A escolha do time foi totalmente remota. Ausência de matérias primas, atrasos nas entregas e fornecedores passando por dificuldades são apenas alguns exemplos do que enfrentamos durante esse processo. Porém, o importante era seguir em frente e apoiar a moda nacional naquele momento tão delicado.
Em 2020, nosso faturamento cresceu 1010%. Agora, já temos um ano de marca e continuamos crescendo de maneira significativa. Sou muito grata aos meus fornecedores e parceiros por entrarem comigo nessa jornada, pois sinto que demos as mãos para encarar essa situação juntos e que todos saímos mais fortes do outro lado.
Sustentabilidade
Um ponto importante foi a escolha do nosso modelo de negócio. Optamos pelo slow fashion, em que nossa produção não está atrelada aos calendários tradicionais da moda. É uma proposta mais editada, com menos lançamentos e contra o consumo desenfreado e descartável da grande maioria dos players do mercado. Além disso, a opção por um produto 100% brasileiro também ajuda a fomentar o setor, sendo uma escolha da qual me orgulho.
No entanto, para aprofundarmos o tema, precisamos entender como se deu o movimento fast fashion, presente na maior parte do mercado de moda e que se baseia em uma filosofia consumista, contrária ao slow fashion.
As empresas de fast fashion têm, como sua essência e foco, roupas que duram apenas uma temporada, de curta duração, ou seja, a moda como forma de consumo extremamente rápida, com contínuas mudanças de tendências.
Mais recentemente, no mundo da moda, onde o consumo vem levando à exploração excessiva de recursos naturais, vem ganhando força o conceito de slow fashion. Ao traduzirmos de forma literal, a expressão slow fashion, em português, significa moda lenta. Para ser mais fiel ao que o movimento traduz, é um novo jeito de produção de peças, em que a qualidade do produto vale mais que a quantidade. Prega-se uma fabricação focada na sustentabilidade, em menos impacto aos recursos naturais, e assim uma maior consciência ambiental. Alguns estilistas brasileiros vêm trabalhando com suas marcas com recursos e conceitos de slow fashion, dentre elas podemos citar Comas, Mel, The LouLou, Mudha, Maria Tangerina, entre outras.
Nesse contexto, a Ginger nasce de uma delicada combinação entre a moda autoral, a paixão pela estética e o respeito pela natureza. A marca abraça o presente enquanto volta o olhar para o futuro, livre das amarras das estações e preocupada com o seu impacto. Contra o efêmero e o superficial, preza pelo consumo inteligente e editado. A Ginger foi pensada para unir conforto, estilo e arte por meio de peças versáteis, com qualidade e design atemporal.
Nós no preocupamos, também, com a escolha dos tecidos, materiais e embalagens, que reforçam a nossa vontade de ressignificar e realizar escolhas mais conscientes. As tags das roupas são feitas de papel semente – um papel reciclado, ecológico e artesanal, assim como as etiquetas são de fio reciclado.
A Ginger também criou ecobags reutilizáveis, produzidas com material biodegradável. Já as embalagens de papel para o envio de produtos têm o selo eureciclo, que garante recompensação ambiental e gera incentivos para aumentar a taxa de reciclagem no país.
Pontos de transformação
A transformação é um dos valores mais importantes para a Ginger e pode ser alcançada de diversas maneiras. Trabalhamos com diversos pontos de transformação dentro e fora de empresa. Queremos fazer parte do movimento de novas marcas que contribuem para o mundo e que estão empenhadas em construir uma sociedade melhor e mais consciente.
Quando pensamos em slow fashion não estamos falando somente de sustentabilidade, pois esse processo está intrinsicamente ligado a mudança de mercado baseado em como as pessoas consomem a moda, mas também em como esse processo vem modificando a moda em si. De forma significativa, o slow fashion é um movimento em prol da inclusão de gênero. Ele traz uma predominância de liberdade diante a todos os padrões estéticos e sociais culturais impostos pela nossa sociedade, uma vez que as novas criações caminham junto à diversidade em contraposição às normas da moda de um modo geral. A forma que nos vestimos diz muito sobre nós. Dentro de um contexto histórico, a moda caminha lado a lado com as nossas perspectivas, valores, vontades e em que somos e principalmente a nossa expressão. Cada roupa leva consigo fontes de inúmeras lembranças e sensações, e, poder elaborar peças que não ferem ou agridam a existência de qualquer corpo é primordial para a consciência humana na construção de um mundo mais justo e igualitário.
Como parte desse todo, atrelamos nosso lançamento a uma causa social importante: 100% do lucro da nossa primeira coleção foi doado à Instituição Gerando Falcões, que ajuda a transformar a vida de moradores das favelas em todo o Brasil pela combinação de educação socioemocional, profissional e acesso às tecnologias. Assim, alinhamos a nossa estreia a uma ação social relevante e ajudamos o Brasil em um momento de muita vulnerabilidade. Essa ação obteve sucesso, pois todo o nosso estoque se esgotou em menos de 12 horas.
Em seguida, para celebrar o Dia da Amazônia, estabelecemos uma parceria com a Casa do Rio, instituição sem fins lucrativos que promove o desenvolvimento humano e territorial, por meio da educação integral, empreendedorismo e agroecologia no estado do Amazonas. Todo o lucro dessa coleção especial de moletons foi revertido para auxiliar na construção de um viveiro agroflorestal, item essencial para ajudar no reflorestamento e no desenvolvimento das comunidades locais. A marca Ginger sempre busca causas relevantes para apoiar.
Equilíbrio
Conciliar o empreendedorismo e a carreira de atriz implica em muitos desafios, mas o sucesso da empresa em tão pouco tempo mostra que é possível haver equilíbrio entre os dois papéis. Outro ponto importante é a influência da imagem da atriz sobre os consumidores da marca. Não há como negar a relevância das minhas redes sociais. É necessária muita responsabilidade, pois as mídias sociais alcançam um grande público. No entanto, honestamente, não acredito que meu papel como influenciadora foi essencial para impulsionar o negócio. Inclusive, sempre estabeleci a separação entre a celebridade e a empreendedora. Em minha opinião, essa compartimentação é fundamental para a saúde do negócio. O desenvolvimento da Ginger ocorreu com os próprios recursos da empresa, objetivo buscado desde o seu planejamento, o que resultou em uma empresa sólida e saudável, independente da minha imagem.
Apesar disso, o poder dos influenciadores digitais como poderosa ferramenta de vendas e de posicionamento é inegável. Ainda assim, não acho que funcione de maneira isolada. Sem um bom planejamento e a estrutura das demais áreas da empresa, nenhum negócio consegue prosperar apenas pela imagem.
Relacionamento com os consumidores
A relação com os consumidores da Ginger é muito honesta e próxima. É muito importante estabelecer essa conexão, não apenas para comunicar as nossas ações de maneira eficiente, mas também para obter o feedback direto do público. Essa troca implica em muito valor e beneficia os dois lados – nós criamos peças que fazem mais sentido para o nosso cliente que se sente acolhido e respeitado dentro de suas necessidades. Da mesma forma, essa abertura nos permite levar mensagens importantes para o público, como ocorre com a promoção de causas sociais.
Slow fashion é um conceito em torno da valorização da roupa. Entrando mais a fundo em como ela foi produzida, quais matérias primas utilizadas e transparência nas práticas aplicadas, tem como objetivo desenvolver uma aproximação com o cliente, pois torna a confiança presente aproximando de maneira genuína e transformadora quem produz e quem consome. Esse movimento realça o conceito de que a moda é uma escolha e não um mandato e é esse o conceito que a Ginger acredita.
Existe uma relação de confiança e respeito onde nos unimos para fazer o bem. Orgulho-me do nosso relacionamento com as consumidoras da Ginger e, hoje, só nas mídias sociais, contamos com uma comunidade de mais de 270 mil pessoas. Esse senso de comunidade é fundamental para a perpetuidade da marca, especialmente em um ambiente digital.
Futuro
Não precisamos falar apenas sobre o futuro. Nos dias de hoje, já não se admite uma nova empresa que não esteja disposta a contribuir para uma sociedade mais justa e responsável. No cenário da moda, a introdução do conceito eco fashion e moda consciente nos mostra que não precisamos consumir de forma avassaladora. É preciso, também, entender os caminhos que o mundo atual trilha, repensando esse lugar de consumo de uma maneira responsável e criativa, fazendo do compartilhamento e reuso um alicerce do futuro.
Esse aspecto não se restringe a setores específicos. É possível fazer parte de ações de impacto de diversas formas, como apoiar as causas sociais, escolher processos de produção e matérias-primas mais sustentáveis, reeducar o cliente em relação ao consumo, entre outras. Existem vários caminhos. Eu acredito não há ação ou ajuda muito pequena. As empresas têm condições e capacidades distintas de contribuir, mas o empenho para encontrar uma forma de fazer a diferença, cada uma a sua maneira, é essencial. Esses valores fazem parte do futuro que precisamos construir juntos.
Este artigo foi produzido por Marina Ruy Barbosa.