História
O homem sobreviveu à história pela capacidade de articular-se em rede; essa é um grupo de pessoas em que cada um executa uma tarefa diferente, mas a totalidade dos membros torna-se mais forte do que cada um de seus componentes individualmente. Para tal sobrevivência, dois requisitos foram necessários: a habilidade de comunicação entre os membros e a tecnologia de movimentação de bens entre eles. A forma mais primitiva de movimentação de valores é o escambo: uma troca direta entre membros, sem parâmetros definidos.
Ao longo do tempo, a quantidade de pessoas do grupo crescia e esse produzia cada vez mais; especializava-se e tornava-se mais forte. Por outro lado, os membros distanciavam-se, pois era cada vez mais difícil conhecer todo mundo. Conhecer bem o outro era fundamental para o sistema de troca direta, pois é necessário um mínimo de confiança para realizar transações. Além disso, os bens eram cada vez mais diversos e poderia ser necessário realizar várias trocas até chegar no objeto almejado.
O Dinheiro
A tecnologia evoluiu: aos poucos, foi-se notando que determinados produtos possuíam alta demanda, tornando-se desejados meios de troca, por serem valorizados. O objeto mais almejado reduzia o número de trocas e tornava o sistema mais eficiente; surgia, assim, o dinheiro. Naturalmente, quem usava-o tornava-se mais produtivo, o que contribuiu para a prosperidade do sistema monetário.
O dinheiro mais eficiente era aquele que não tinha valor de consumo, apenas de reserva de valor. Para isso, o objeto dinheiro não podia ser perecível e apodrecer no decorrer do tempo, caso contrário, perderia seu valor estocado. Outra necessidade era que o dinheiro fosse divisível para atender diferentes valores e escalas de trocas. Deveria também ser fácilde armazenar e difícil de ser roubado, mas, principalmente, escasso e de árdua produção. O dinheiro abundante ou replicável perde seu valor, pois a oferta torna-se excessivamente alta. Muitos objetos de dinheiro foram experimentados ao longo da história e cada um apresentou um problema: o cobre estragava, o sal tornou-se abundante e a pedra, cara de produzir; até que chegou o ouro: escasso, divisível, reluzente e difícil de reproduzir.
O Padrão-Ouro
O ouro tornou-se de forma rápida e em escala global a maior reserva de valor – e persistiu durante séculos. Os gregos foram os primeiros a cunhar moedas deste material e deram início à civilização ocidental. A Grã-Bretanha, em 1717, foi pioneira em estocar ouro no banco central, enquanto Isaac Newton era mestre da Casa da Moeda Real, tornando a Inglaterra a maior potência mundial da época.
Depois da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos haviam acumulado muito ouro e enviado dólares em troca da moeda. No ano de 1944, o Acordo de Bretton Woods oficializou o dólar como a moeda global de comércio lastreada pelo ouro estocado. Diversos países passaram a emitir a sua própria moeda, usando como parâmetro dólar estocado.
O Padrão-Dólar
Era notável a dificuldade de manter o padrão-ouro, pois tal moeda era difícil de armazenar e fácil de roubar em pequenas quantidades. Os estoques passaram a ser armazenados em cofres de bancos, que emitiam dinheiro em papel perecível; à medida que o papel apodrecia, poderia ser renovado no banco. Assim, ao longo do tempo, quem armazenava ouro podia até esquecer-se disso.
Dessa forma, o dinheiro volta a ter um papel de confiança: na instituição, no banco e no país. Tal relação de confiança tornou-se tão forte que em 1971 os Estados Unidos decidiram desfazer o lastro de seu papel em ouro: apenas o papel e a confiança eram suficientes. Assim, os Estados Unidos foram lançados ao status de superpotência mundial.
Sem o lastro em ouro, os Estados Unidos alavancariam sua economia emitindo cada vez mais dólares ao mesmo preço. O mercado de derivativos fez Wall Street evoluir como nunca. Sem o freio do governo, os jogadores apostavam cada vez mais alto, o que passou a estremecer a tão importante relação de confiança.
Internet
Em 1975, surgiram os computadores e, depois, uma forma rápida de transmissão de bits e bytes entre eles: a Internet. Assim, foi dada a largada para a corrida ao dinheiro digital. As máquinas ainda eram caras e elitizadas, mas, com o passar do tempo, foram barateadas, até o surgimento do celular. Esse tomou o mundo e levou a Internet para a imensa maioria das pessoas; era o sistema ideal de trocas, mas, assim como os anteriores, tinha um problema: era fácil de reproduzir. Bastava um Copy&Paste (copiar e colar, em tradução literal) para duplicar o dinheiro; então, como reserva de valor, era péssimo.
Muitos técnicos da informática tentaram programar um sistema de dinheiro digital que não pudesse ser copiado e ainda preservasse as boas características dos bits e bytes. Coincidentemente ou não, quando estourou o sistema de alavancagem americano, em 2008, um usuário chamado Satoshi Nakamoto depositou num fórum da Internet um código que funcionou; a primeira moeda digital foi chamada de Bitcoin.
O Sistema Bitcoin
Há 10 anos, o mundo vem testando o novo sistema. Esse é seguro (nunca foi hackeado), fácil de transportar e armazenar, difícil de duplicar, rastreável e, o mais importante, é anti- inflacionário. O sistema é programado em código imutável, possuindo 21 milhões de unidades altamente divisíveis. É, então, potencialmente um dinheiro mais eficiente do que o ouro; e, se a história estiver certa, a transição para o padrão-bitcoin será inevitável, como indico no livro Bitcoin, Blockchain e Muito Dinheiro.
Não bastando a alta da tecnologia, em 2020 surge a pandemia e, para salvarem suas economias, os países vêm emitindo mais dinheiro do que nunca: trilhões. Num primeiro momento, houve uma corrida para o ouro, mas os maiores conhecedores da tecnologia já começaram a migrar para o Bitcoin; afinal, investir em ouro continua na alavancagem, porque este é difícil de armazenar, como mencionado anteriormente.
Este momento tem sido chamado de O Grande Reset Financeiro, pois possivelmente a sociedade voltará a tomar posse de seus valores, com uma moeda padrão mundial que não pertence a ninguém e a todos ao mesmo tempo. Talvez seja o melhor programa social de todos os tempos; finalmente, o trabalhador vai proteger-se da inflação.